O decreto regulamenta o procedimento para identificação, reconhecimento, delimitação, demarcação e titulação das terras ocupadas por remanescentes das comunidades dos quilombos
O Plenário do Supremo Tribunal Federal (STF) formou maioria a favor do decreto sobre a demarcação de terras quilombolas. A Corte retomou nesta quinta-feira o julgamento de uma ação, movida pelo Democratas (DEM), que questiona a regulamentação assinada pelo então presidente Luiz Inácio Lula da Silva, em 2003. Ainda faltam votar os ministros Celso de Mello, Marco Aurélio Mello, Luiz Fux e a presidente do STF, Cármen Lúcia.
Apesar de já ter seis ministros que entendem constitucional o decreto, dois deles, Dias Toffoli e Gilmar Mendes, acataram parcialmente o pedido do DEM para assentar que só devem ser titularizadas áreas ocupadas pelos quilombolas na data de promulgação da Constituição, em 1988, salvo comprovação de perda da posse em função de atos ilícitos.
Na sessão desta quinta, já votaram Edson Fachin, Luis Roberto Barroso, Ricardo Lewandowski e Gilmar Mendes. Rosa Weber e Dias Toffoli proferiram seus votos em outras sessões. Há somente uma posição favorável ao pedido do DEM, que foi dado pelo ex-ministro Cezar Peluso em 2012, quando era relator do caso. Para ele, o decreto é inconstitucional.
Marco temporal
O ministro Dias Toffoli foi quem abriu a divergência sobre a questão do marco temporal, na sessão de novembro de 2017. Na época, depois de votar, Fachin pediu vista – mais tempo para análise.
Assim como Rosa e Fachin, Lewandowski divergiu de Toffoli nessa questão e “rechaçou” a solução apresentada. Acompanhando a argumentação de Fachin, o ministro disse que seria “quase impossível” provar que a terra foi apropriada de maneira ilegal. “O que me ocorreu é que essa prova é diabólica, difícil ou impossível de ser conseguida. Como vai se fazer uma prova de fatos que ocorreram há quase meio século atrás? Não se pode exigir que um grupo assuma o ônus da prova”, afirmou.
Durante a manifestação de Lewandowski, Toffoli disse que estava havendo uma “interpretação equivocada” do seu voto. Segundo o ministro, a compreensão do marco de 1988 é para evitar que “em 2030 uma comunidade exija que precisa de mais terra”. “Dou interpretação para evitar que haja continuidade do conflito. É para evitar conflitos futuros, não é para rechaçar o passado”, afirmou.
Texto
O decreto regulamenta o procedimento para identificação, reconhecimento, delimitação, demarcação e titulação das terras ocupadas por remanescentes das comunidades dos quilombos. O DEM afirma que o texto determina “indevidamente” a realização de desapropriação pelo Incra (Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária) das áreas que supostamente estejam em domínio particular para transferi-las aos remanescentes das comunidades dos quilombos.
Também reclama que a regulamentação não devia ter sido feita através de decreto, mas através de lei. O DEM ainda é contrário ao direito concedido por autodeclaração como remanescentes das comunidades dos quilombos.
Lewandowski afirmou que a autodeterminação não suporta fraudes, segue parâmetros subjetivos e “tem também contornos bastante objetivos”.
Gilmar Mendes questionou a regulamentação do texto constitucional por decreto, mas acabou acompanhando o voto de Toffoli. Para Gilmar, “a ideia de que direitos fundamentais dispensam regulamentação é extravagante”. “A base do sistema é o princípio da legalidade, e não da ‘decretalidade’, e por razões históricas. É o parlamento que faz a lei e tem representatividade.”