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Cientistas criam curativo que pulsa para tratar sequelas de corações infartados

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O ataque cardíaco mata partes do coração. E, uma vez mortas, as células não se regeneram. Mas pesquisadores parecem ter encontrado uma maneira de reverter isso – e possivelmente salvar milhares de vidas.

Os médicos costumam dizer que quando alguém sofre um ataque cardíaco, “o tempo é músculo”.

O coração depende de um fornecimento contínuo de oxigênio proveniente das artérias coronárias. Se elas entopem e o abastecimento para, as células musculares do órgão começam a morrer em questão de minutos.

Em muitos casos, a menos que os cirurgiões consigam aliviar a obstrução dentro de uma hora, mais de 1 bilhão de células musculares são irreversivelmente perdidas.

Os pacientes que sobrevivem costumam desenvolver um quadro de insuficiência cardíaca permanente. E, cinco anos após o ataque, 50% deles não estarão mais vivos. No Brasil, cerca de 50 mil pacientes morrem anualmente em decorrência de insuficiência cardíaca, de acordo com a Sociedade Brasileira de Cardiologia.

“No fim das contas, seus corações ficam tão fracos que não conseguem sustentar um fluxo de sangue suficiente e simplesmente param por completo”, explica Sanjay Sinha, cardiologista do Hospital Addenbrooke, em Cambridge, no Reino Unido.

Nos próximos cinco anos, no entanto, a medicina regenerativa poderá oferecer uma nova alternativa radical: curativos para o coração, preparados em laboratório.

Diferentemente de alguns órgãos, como a pele e o fígado, o coração tem uma capacidade muito limitada de regeneração. As células musculares cardíacas se replicam a uma taxa de apenas 0,5% ao ano, o que não é suficiente para reparar qualquer dano significativo.

As células mortas acabam sendo substituídas por camadas espessas de tecido cicatrizado rígido e resistente, o que significa que essas partes do coração simplesmente deixam de funcionar.

Atualmente, o transplante é a única opção para pacientes com insuficiência cardíaca. Mas, na ausência de doadores em número suficiente, menos de 400 procedimentos do tipo são realizados por ano no Brasil.

As células-tronco podem oferecer uma alternativa. Em ensaios clínicos, cientistas tentaram “recuperar a musculatura” de corações lesados injetando células-tronco individuais – do sangue ou da medula óssea do próprio paciente – diretamente no coração.

Embora essa abordagem tenha regenerado com sucesso os vasos sanguíneos comprometidos e melhorado, assim, o fluxo de sangue para o coração, apresentou um benefício mínimo em termos de resolver o problema principal: fazer crescer novamente o músculo cardíaco perdido. Isso porque 95% das células-tronco injetadas não são incorporadas ao órgão e desaparecem imediatamente na corrente sanguínea.

Curativos

Mas, em parceria com uma equipe de biólogos do Instituto de Células-Tronco da Universidade de Cambridge, Sinha está desenvolvendo uma solução ligeiramente diferente: curativos para “remendar” o coração. São retalhos minúsculos de músculo cardíaco que pulsam – cada um com menos de 2,5 centímetros quadrados de área e meio centímetro de espessura – criados em pequenas placas no laboratório.

Cultivados ao longo de um mês, os curativos são feitos a partir de amostras de células do sangue, que são reprogramadas para a função de um determinado tipo de célula-tronco (capaz de se transformar em qualquer célula no corpo humano) – no caso, em células do músculo cardíaco, dos vasos sanguíneos e do epicárdio, membrana que envolve e dá forma ao coração.

Esses aglomerados de células cardíacas são então cultivados em um suporte especial, sendo organizados e alinhados em uma estrutura semelhante à do tecido cardíaco verdadeiro.

“Acreditamos que esses curativos terão uma chance muito maior de serem naturalmente assimilados pelo coração do paciente, já que estamos criando um tecido totalmente funcional que já bate e se contrai através da combinação de todos esses tipos diferentes de células que se comunicam entre si”, explica Sinha.

“Sabemos que as células epicárdicas são particularmente importantes na coordenação do desenvolvimento adequado do músculo cardíaco. Pesquisas mostram que, nos embriões, ocorre muita interferência entre o epicárdio e o coração que está se desenvolvendo”, acrescenta.

Sinha se prepara atualmente para testar os curativos em camundongos e, em seguida, em porcos. Se tudo der certo, o cardiologista pode estar pronto para realizar as primeiras experiências em seres humanos em cinco anos.

Em busca da batida perfeita

E ele não está sozinho. Nos Estados Unidos, uma equipe formada por cientistas das universidades de Stanford, Duke e Wisconsin também está tentando desenvolver curativos cardíacos.

Assim como Sinha, os pesquisadores imaginam um procedimento que começaria pela identificação dos tecidos cardíacos lesados por meio de exames de ultra-sonografia e ressonância magnética. Com base no formato das cicatrizes, eles imprimiriam um curativo personalizado em 3D. Os cirurgiões abririam então a caixa torácica e costurariam o “remendo” diretamente no órgão, de maneira que fique conectado às veias e artérias existentes.

“Para pacientes com insuficiência cardíaca particularmente grave, serão necessários vários curativos em diversos lugares, pois o coração inteiro se dilata para tentar se adaptar ao dano”, afirma Tim Kamp, professor de biologia regenerativa da Universidade de Wisconsin.

“Ele muda de forma, pode ter a aparência de uma bola de rúgbi, de basquete ou de um grande balão.”

Um dos principais desafios é integrar eletricamente o curativo ao coração, a fim de garantir que ambos pulsem sincronizados. Qualquer conexão elétrica defeituosa poderia resultar em um ritmo cardíaco anormal.

“Podemos colocar o curativo no coração com nossas ferramentas cirúrgicas, mas não podemos forçá-los (o órgão e o curativo) a se entender”, diz Kamp.

“Esperamos que eles façam isso. Acreditamos que os sinais elétricos que passam como uma onda através do músculo cardíaco, dizendo para ele contrair, façam com que o curativo contraia na mesma proporção.”

Procedimento mais barato

Se os desafios forem superados, Sinha afirma que eles poderão não apenas salvar vidas, mas também economizar dinheiro.

No Reino Unido, um transplante cardíaco custa cerca de £500 mil – algo em torno de R$ 2,5 milhões, incluindo os custos da internação hospitalar. Para os milhares de pacientes com insuficiência cardíaca que não conseguem um transplante, as despesas com cuidados médicos contínuos e repetidas internações podem ser ainda maiores. Já o valor estimado atualmente para um “curativo cardíaco” gira em torno de £70 mil – quase R$ 350 mil.

Além disso, os curativos são feitos a partir do sangue do próprio paciente, o que significa que eles não precisariam passar por algumas complicações associadas aos transplantes – como as altas doses de drogas imunossupressoras para evitar a rejeição do órgão.

“Um coração ferido é um ambiente hostil, altamente inflamado, em que pode ser difícil para o novo tecido sobreviver”, diz Kamp.

“A vantagem dos curativos cardíacos é que eles são customizados para o paciente, então é improvável que o coração os rejeite.”

Segundo os pesquisadores, a tecnologia pode mudar a vida de milhões de pessoas ao redor do mundo.

“A insuficiência cardíaca pode muitas vezes incapacitar o indivíduo”, diz Sinha.

“Você está sempre exausto, não consegue subir sequer um lance de escadas. Mas, pela primeira vez, achamos que somos realmente capazes de recriar o tecido cardíaco vivo, que é idêntico ao do paciente, onde as células se comunicam de maneiras misteriosas e maravilhosas, trabalhando juntas como fazem no corpo.”

“Se conseguirmos ajustar o procedimento nos próximos anos e garantir que seja completamente seguro, ele poderá ajudar essas pessoas a terem uma vida normal novamente.”

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