Governo já propôs dois acordos aos caminhoneiros, mas enfrenta obstáculos para encerrar paralisação, como pulverização de líderes, radicalização, politização e até críticas de aliados
Dois acordos e uma greve ainda resistente. Nove dias depois do início da paralisação de um número incalculável de caminhoneiros em todo o país, o governo segue enfrentando sérias barreiras para a normalização. A primeira é a dificuldade em encontrar lideranças representativas da categoria, devido ao grande número de transportadores autônomos. A segunda é a radicalização de grevistas, que levou o ministro da Casa Civil, Eliseu Padilha a declarar que as negociações estão concluídas e que a Polícia Federal vai prender os líderes que resistem ao fim do movimento.
Outra barreira é o que o governo chama de politização do movimento, que levou o Planalto ontem a informar que a Polícia Federal vai procurar pessoas infiltradas, com interesses alheiros aos dos caminhoneiros, que a própria Associação Brasileira de Caminhoneiros admite estar ocorrendo. Para o governo, pessoas infiltradas estariam insuflando discursos a favor de uma intervenção militar. E uma nova barreira são críticas que o governo recebe na condução das negociações, inclusive de apoiadores e até de aliados e de ministro do Supremo Tribunal Federal. É o caso da Confederação Nacional da Indústria (CNI), da Federação das Indústrias do Estado do Rio de Janeiro (Firjan) e da líder do MDB, partido do presidente Temer, no Senado, Simone Tebet (MS).
O governo, entretanto, está otimista. “Começa a haver retomada, mas ainda não é o que gostaríamos”, afirmou Padilha. Segundo ele, dos 1,2 mil bloqueios, 728 haviam sido desfeitos ontem à tarde, o correspondente a 56%. E que ainda haviam pelos menos 557 pontos de mobilização. À noite, a Polícia Rodoviária Federal informou que eram 594 pontos. “Temos que fazer com que nossos motoristas fiquem conscientes do quanto são importantes e o quanto necessitamos que voltem à normalidade as nossas estradas”, afirmou Padilha.
O fim da greve, porém, é incerto. Ao menos cinco entidades de caminhoneiros já se disseram favoráveis ao fim do movimento, mas a Confederação Nacional dos Transportadores Autônomos (CNTA) e o Sindicato Interestadual dos Caminhoneiros Autônomos não consideram a paralisação encerrada. Outros representantes ainda afirmam que nem todas as reivindicações foram atendidas.
CRÍTICAS O ministro Marco Aurélio Mello, do Supremo Tribunal Federal (STF), disse que o governo subestimou a situação dos caminhoneiros, o que resultou em reação atrasada sobre a crise. “O governo é o órgão mais bem informado que temos. Penso que subestimaram e foram surpreendidos com essa reação que paralisou o país”. As negociações não escaparam de crítica nem mesmo da líder do partido dele no Senado, Simone Tebet. Ela criticou a dificuldade do governo em aceitar o congelamento do preço do diesel por 60 dias, exigência dos caminhoneiros. “Não consigo entender, diante do caos iminente e prejuízos bilionários, governo cede em reivindicações difíceis, a serem compensadas pelo Tesouro (redução em R$ 0,46/litro diesel e MP que isenta pedágio para eixo suspenso) e empaca na prorrogação do congelamento do diesel para 60 dias”, escreveu Tebet no Twitter.
Outros ataques inesperados partiram de empresários. Para a CNI, a edição da Medida Provisória 832/2018 é “grande retrocesso”. A MP fixa valores mínimos de frete para o transporte de carga. A CNI sustenta que “a fixação de preços mínimos infringe o princípio da livre iniciativa e é ineficaz”, além de não corrigir o problema de excesso de oferta de caminhões no mercado. A entidade diz ainda que o tabelamento do frete levará ao aumento geral de preço.
Já a Firjan disse que o Brasil vive momento de “combustão tributária”, segundo declaração do economista-chefe da entidade, Guilherme Mercês. Ele criticou também a decisão do governo de reonerar 46 atividades industriais, com aumento de R$ 9 bilhões na arrecadação, com a justificativa de cobrir perda de R$ 4 bilhões até o fim de 2018 com a redução da Cide e do PIS/Cofins. “A contrapartida para redução do diesel tem que ser a reorganização das contas públicas. Teremos problema se cada setor for requisitar parcela do orçamento”, disse.