Para atender à demanda crescente por serviços de logística, empresa muda estratégia de negócios e tenta se adequar aos novos tempos em meio a dificuldades financeiras
Neste ano, pela primeira vez na história, os Correios devem entregar mais encomendas do que cartas. Para dar conta do crescimento desse tipo de serviço e aumentar a participação dessa fonte de receita no caixa da companhia (leia mais abaixo), a empresa estatal tem passado por uma série de mudanças nos últimos três anos, intensificadas a partir de 2017.
O resultado da área de encomendas está diretamente ligado ao crescimento das compras pela internet. Os dados ainda não estão finalizados, mas a previsão é que 2017 tenha alcançado vendas de R$ 48,8 bilhões – expansão de cerca de 10% em relação ao ano passado. Levantamento feito no primeiro semestre de 2017 mostra que os fretes pagos nas compras online somaram R$ 1,03 bilhão. O valor médio do frete por compra nesse canal é de R$ 29,93.
Para pegar carona em um mercado com crescimento constante, a empresa vai investir, até 2020, cerca de R$ 440 milhões na implantação de dez sistemas automatizados de triagem com o objetivo de triplicar a capacidade de processamento das encomendas e aproveitar o aumento da demanda. Sem esse tipo de apoio, os Correios poderiam ter problemas de falta de capacidade de processamento de pedidos. No ano passado, por exemplo, foi batido o recorde de 1 milhão de encomendas entregues por dia.
Mas não são apenas os centros de triagem que estão contando com um empurrão tecnológico para dar conta do aumento da demanda no segmento de encomendas. Os Correios também colocaram tecnologia nas mãos dos carteiros. Desde dezembro e até o fim de fevereiro, 58.679 profissionais passarão a usar smartphones no trabalho de rua. A ideia é que o rastreamento das entregas seja feito em tempo real e não dependa mais que o profissional volte a uma das agências ou centro de distribuição para atualizar o passo a passo da mercadoria. O investimento nos celulares foi de R$ 20 milhões.
Chefe do Departamento de Encomendas e E-commerce dos Correios, Lemuel Costa e Silva explica que o atendimento ao comércio eletrônico se tornou uma das prioridades dentro da empresa. “Por isso temos investido em novos serviços e em mais funcionalidades para o usuário e para as lojas virtuais. Em um futuro muito próximo, nossos profissionais vão deixar de ser carteiros para serem ‘pacoteiros’”, explica.
Além de melhorar a entrega convencional, os Correios precisaram investir em outras formas de atender ao consumidor do comércio eletrônico que não tem como receber seus produtos em casa. Pesquisa feita pela própria empresa mostrou que cerca de 20% dos brasileiros não compram nas lojas virtuais por falta de opção à entrega tradicional, no domicílio.
Por isso, os Correios decidiram incluir nos seus serviços a opção do “Clique e Retire”. Os sites da Netshoes, do Ponto Frio e da Casas Bahias (bandeiras da Via Varejo) oferecem como opção ao cliente, no momento da escolha do frete, a possibilidade de pegar o produto em uma agência dos Correios. Em breve, a Casa&Vídeo passará a oferecer a mesma opção e os Correios também estão em negociação com a B2W, dona do Submarino, Americanas e Shoptime. Por enquanto, o “Clique e Retire” funciona em 112 agências de São Paulo, que trabalham em horário estendido até o período noturno e fim de semana. No Brasil, até agora são 450 unidades que fazem parte dessa modalidade de entrega.
Para que os Correios oferecessem mais essa opção para o comércio eletrônico, foi preciso investir em ferramentas tecnológicas que permitissem a comunicação com as lojas virtuais. O plano de Costa e Silva é ambicioso. “Queremos ter a adesão de todos os grandes marketplaces até o fim do primeiro semestre.”
Mas Costa e Silva sabe que não basta levar os clientes do e-commerce para as agências dos Correios. É preciso que ele tenha um atendimento especial – hoje, o tempo médio para o atendimento, seja qual for o serviço, é de 20 minutos. Por isso, já está em estudo a possibilidade de criar uma fila exclusiva para o “Clique e Retire”.
Como a entrega de mercadorias pode ser cada vez um desafio maior por conta do volume e das mudanças nos grandes centros urbanos, Costa e Silva explica que os Correios estão colocando em prática outros dois serviços. Um deles é a caixa de correio inteligente, instalada pelos condomínios onde não há porteiros. O carteiro tem a chave das portas e coloca as mercadorias sem ter de acionar o morador do edifício. Até agora o serviço está em operação apenas em parte das cidades de Curitiba, Porto Alegre e São Paulo, mas a intensão é ampliar a oferta.
Outra forma de levar o serviço de entrega de encomendas até o cliente será por meio dos lockers – armários parecidos com os que são usados em vestiários de academias e clube. O conceito, muito conhecido nos Estados Unidos e parte da Europa, passou a ser adotado recentemente por algumas redes varejistas, como a Casas Bahia e o Ponto Frio. Nele, a compra é feita pelo site e o pedido é entregue no locker escolhido pelo cliente, de acordo com a localização. Os Correios estão em fase de licitação para a compra de 100 armários e, segundo Costa e Silva, eles deverão estar em funcionamento no segundo semestre de 2018. São Paulo será a primeira cidade a contar com a novidade.
Empresa tenta superar dificuldades financeiras
Ao mesmo tempo em que os Correios aceleram a expansão do serviço de encomendas e se adaptam a uma nova realidade de mercado, há internamente uma série de pressões. No ano passado, a empresa fez dois Programas de Demissão Voluntária (PDV) com o objetivo de enxugar a folha de pagamento.
O caos financeiro é grande. Por isso, o governo cogita privatizar a empresa. Em setembro passado, Moreira Franco, da Secretaria-Geral da Presidência, admitiu que havia um estudo nessa direção. Na ocasião, o ministro disse que a “situação financeira, pelas informações que o Planejamento tem e nos passa, é muito difícil”.
Outra solução para melhorar os números foi fechar cerca de 250 agências próprias (apenas em cidades com mais de 50 mil habitantes). Com isso, a direção da empresa esperava diminuir as despesas com aluguel de imóveis e manutenção. Para atender a essa demanda, a ideia era fazer novos processos de licitação para oferecer franquias das agências a possíveis interessados.
Como efeito indireto da crise, a empresa vem registrando um aumento das despesas com indenizações geradas por atrasos, extravios, danos ou roubos de correspondências e de encomendas. Entre 2011 e 2016, segundo relatório da Controladoria Geral da União (CGU), as indenizações triplicaram, passando de R$ 60 milhões para R$ 201,75 milhões. Só em 2016 foram cerca de 10 milhões de indenizações.
Até novembro do ano passado, o prejuízo dos Correios já chegava a R$ 2,03 bilhões – 17% maior do que o verificado em 2016. Com isso, a empresa chegou ao terceiro ano consecutivo no vermelho. O maior impacto nas contas vem dos custos com o plano de saúde dos funcionários.