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Detentos fazem a manutenção e a limpeza de unidades prisionais de Minas Gerais

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A blindada começa a chiar no PL por volta das 11h. Quem faz a entrega são os faxinas, responsáveis também por distribuir o PH, a dentuça, o espumante e a goela. Os colegas da lavanderia não recolhem coruja de forma alguma, apenas manta da cadeia, lençol e praiana. A manta paisana ou do mundão também é levada para a lavanderia. Todos esses termos, aparentemente enigmáticos, fazem parte do cotidiano dos cerca de 68.000 detentos de Minas Gerais, especialmente dos 3.700 que trabalham em atividades de entrega de marmitas e produtos de higiene, de lavanderia, limpeza e manutenção.
Esses homens e mulheres recebem remição, ou seja, para cada três dias de atividades, um a menos no cumprimento da pena. Eles exercem atividades fundamentais para o funcionamento de penitenciárias, presídios e de centros de remanejamento. Para isso, eles passam por avaliação da Comissão Técnica de Classificação (CTC), composta por profissionais das áreas de segurança, psicossocial, jurídica e de saúde.
O diretor-geral do Presídio de Montes Claros, Gilton Costa Silva, descarta qualquer tipo de discriminação por parte dos presos que não participam dessas atividades. “Aqui no presídio os presos pedem oportunidades de trabalho. Jamais houve qualquer preconceito contra aqueles que fazem limpeza ou reparos na unidade. Aliás, o que existe é incentivo e respeito”, garante o diretor. Nesse presídio do Norte de Minas, até viaturas da unidade e da 11ª Região Integrada de Segurança Pública (Risp) são consertadas por um dos detentos.
Na penitenciária mais antiga do estado, a José Maria Alkimin, em Ribeirão das Neves, na Região Metropolitana de Belo Horizonte (RMBH), 233 presos desenvolvem atividades com remição de pena em prol da unidade: serviços na horta, criação de porcos e cavalos, fabricação de queijo, capina, manutenção, faxina e lavanderia. Desse total, 68 trabalham na área intramuros e 165 na área externa.
Somente nos PLs, como são chamados os pavilhões, são 16 presos na função de faxina, quatro em cada um. A unidade preserva os nomes antigos: Capela e Cinema, no primeiro prédio, e Máxima e Lavoura, no segundo. Na PJMA, sigla pela qual os servidores e detentos se referem à Penitenciária, os 233 presos da limpeza e manutenção representam um número maior do que a lotação de muitos presídios de cidades do interior.
Blindada
O termo não tem qualquer relação com objeto à prova de balas. Blindada nada mais é que a marmita recebida pelos detentos. Ela chega dentro de um isopor que, ao ser deslocado no chão, faz o chiado, anunciando a chegada. Existem, ainda, outros apelidos para a marmita, como bandeco ou cascuda.
Conhecer as gírias utilizadas pelos detentos ajuda a entender o universo carcerário. O faxina Mike Douglas de Jesus, de 23 anos, é quem esclarece boa parte dos termos como intérprete. Além disso, em rápida conversa, conta sobre o dia a dia no Pavilhão Capela, onde um de seus princípios é seguir as normas da direção da penitenciária.
“Tá todo mundo no mesmo sofrimento! Não adianta beneficiar uns e prejudicar outros. Por isso, não atendo aos pedidos de relves, que é repetir a blindada”, explica. Ele começa a distribuir no quinto andar do pavilhão e vai descendo com as refeições. Se faltar no primeiro andar, é dele a responsabilidade.
No delivery de Douglas também constam itens de higiene, como o PH, o espumante e a dentuça – ou seja, papel higiênico, sabonete e escova de dente. A goela é parceira inseparável da blindada, uma colher de plástico entregue ao preso quando dá entrada em qualquer unidade prisional do Estado. No horário da tarde é servido pão de sal com café e uma vaquinha, um saquinho de plástico com 200 ml de leite. “A cadeia não fornece trator (barbeador). São os familiares que levam”, enfatiza o faxina.
Bodas de Pérola
“São 30 anos de trabalho na PJAMA. Praticamente um casamento, em quase todos os postos de trabalho da unidade”. É assim que o agente de segurança penitenciário Valdeir Lopes Pêgo, de 62 anos, define sua relação com a tradicional Penitenciária Agrícola de Neves (PAN), fundada em 1938 e conhecida por esse nome pelos moradores do município.
Há quatro anos, Pêgo supervisiona as atividades dos detentos na lavanderia e faz questão de elencar os requisitos necessários: “Vontade de cumprir a pena até o fim e estudar”, afirma o agente. Na sequência estão o interesse com o serviço, bom relacionamento interpessoal e organização.
Uma das lições básicas para se operar a lavadora com capacidade para 50 quilos, a secadora para 30 e a centrifugadora também para 30 quilos é nunca recolher coruja (cueca). Cada um lava a sua na própria cela.
Heverton Silva, de 26 anos, é o detento veterano da lavanderia que tem parceria com o novato Tiago Henrique Vasconcelos, de 23 anos. Juntos, eles recolhem e entregam lençóis, uniformes, cobertores, toalhas e capas dos coletes à prova de bala. O primeiro está há dois anos no setor e o segundo há sete meses. A dupla anota e numera as peças. Depois, devolve tudo para as celas de origem. Na devolução, vai uma surpresa dobrada entre as peças: versículos da Bíblia impressos por uma instituição brasileira de divulgação do livro sagrado, a Sociedade Bíblica do Brasil.
“Temos contato com vários presos e escutamos, com frequência, queixas e lamentos. Tentamos ajudar, seja encaminhando os pedidos para a direção da unidade ou pelas mensagens de fé e esperança deixadas nas entregas”, revela Heverton.
Triângulo
O Sistema Prisional de Minas Gerais conta também com a experiência profissional de detentos multifuncionais, como é o caso de Wagner Rui Filho, de 37 anos. Ele exerce as funções de pedreiro, bombeiro hidráulico e eletricista na Penitenciária Professor Aluízio Ignácio de Oliveira, em Uberaba, no Território Triângulo Sul. “Eu me sinto útil, mesmo dentro de uma penitenciária. Faço de tudo um pouco e acho que bem feito”, comenta Wagner.
Nas frentes de trabalho também há mulheres. Damiana Aline Soares, de 28 anos, presa no pavilhão feminino da unidade de Uberaba, é responsável pela faxina. Em setembro, ela deve passar para o regime semiaberto. “Eu me sinto valorizada pelas tarefas que realizo. Sair da cela dá uma sensação de certa liberdade, um alívio”, diz.
Banco da família
Uma reforma ou melhoria em uma penitenciária não significa necessariamente mais segurança ou ampliação de vagas. No caso da construção de um banco, na área de espera para as visitas da Penitenciária José Maria Alkimin, a benfeitoria representa um pouco mais de conforto e humanização. O local já tem cobertura para dias de chuva ou sol, mas precisava aumentar o número de assentos para os familiares.
Wagner Sabino Júnior, de 25 anos, coloca a mão na massa para entregar essa obra. Já no terceiro dia de trabalho na área de manutenção da PJMA, ele se apresentou e assumiu a tarefa. “Isso aqui é uma felicidade dupla: minha família vai poder aguardar sentada a hora de entrar para me visitar e ainda voltei a uma atividade que tinha quando estava em liberdade”, conta Júnior, que recebe a mãe, a esposa e a filha menor de dois anos para visitas periódicas.

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